quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Caracterizando os distúrbios de aprendizagem propriamente ditos


Definir, de fato, o que corresponde a tal classe de problemas não é uma 
tarefa fácil conforme podemos verificar pela  definição do próprio National Joint 
Comittee of Learning Disabilities   (1980) segundo o qual o Distúrbio de 
Aprendizagem corresponde a “um termo genérico que se refere a um grupo 
heterogêneo de transtornos que se manifesta por dificuldades significativas na 
aquisição e uso de habilidades para ouvir, falar, ler, escrever e realizar cálculos 
matemáticos. Embora o distúrbio de aprendizagem possa ocorrer 
concomitantemente com outras condições  deficitárias (como distúrbios sensoriais, 
deficiência mental, distúrbios sociais e emocionais), ou influências ambientais 
(diferenças culturais, instrução insuficiente ou inapropriada), não é resultado direto 
de tais condições ou influências.”  Presume-se que tais transtornos são devidos a 
uma disfunção do sistema nervoso central resultando de fatores como diferenças 
anatômicas, genéticas, atraso neuromaturacional, desequilíbrio neuroquímico ou 
metabólico e severa deficiência nutricional (HARRIS e HODGES, 1995) 
Neste sentido, de acordo com Gonçalves (2003), a aplicação do modelo 
neuropsicológico aos distúrbios de aprendizagem considera que eles constituem a 
expressão de uma disfunção cerebral específica, causada por fatores genéticos ou 
ambientais que alteram o neurodesenvolvimento. Relata, ainda, cinco sistemas 
funcionais relacionados com funções cognitivas, conforme descreve Pennington 
(1991, apud GONÇALVES, 2003): 

1. Região perisilviana esquerda: responsável por funções ligadas ao 
processamento fonológico, sendo que sua disfunção ocasionará transtornos 
disléxicos.


2. Area do hipocampo e amígdalas de ambos os hemisférios: mantem relação 
com a memória de longo prazo levando a transtornos mnésicos no caso de 
alterações.  

3. Região posterior do hemisfério cerebral direito: desempenha uma função 
cognitiva espacial. Alterações desta área levam à síndrome de disfunção 
hemisférica direita, com sintomas de  déficit visuo-espacial, discalculia e 
disgrafia. 

4. Região anterior do hemisfério cerebral direito: a região do sistema límbico e 
a região órbito-frontal do hemisfério  direito têm função cognitiva social. 
Disfunções nesta área produzem alterações comportamentais de gravidade 
variada e com expressão mais grave nos quadros autísticos. 

5. Lobo pré-frontal: desempenha função de planejamento e execução motora. 
As alterações desta área produzem a síndrome disexecutiva com prejuízo 
da atenção e da iniciativa, déficits nos processos de planejamento e 
antecipação, assim como dificuldades nas abstrações . 

Por outro lado, deve ser apontado que, conforme Ciasca (2003), as 
dificuldades relativas ao aprendizado escolar podem atingir de 5 a 20% da 
população escolar, em países desenvolvidos. Entretanto, somente 7% teriam 
algum tipo de disfunção neurológica, sendo 5% com sinais neurológicos leves e 
2% com disfunções graves.  
Considerando-se o DSM-IV, Manual  Diagnóstico e Estatístico de 
Transtornos Mentais (APA, 1994), vemos que os transtornos de aprendizagem são 
definidos como “Transtornos das Habilidades Escolares” e incluem os Transtornos 
de Leitura, Transtornos da Matemática, Transtornos da Expressão Escrita e 
Transtornos da Aprendizagem sem outra Especificação. 
Ainda, segundo o DSM-IV (APA, 1994), os “Transtornos de Aprendizagem 
sem outra Especificação” dizem respeito aos “Transtornos de Aprendizagem que 
não satisfazem os critérios para qualquer Transtorno da Aprendizagem Específico, 
podendo incluir problemas em todas as três áreas (leitura, matemática, expressão 
escrita) que, juntos, interferem significativamente no rendimento escolar, embora o 
desempenho nos testes que medem cada habilidade isoladamente não esteja
acentuadamente abaixo do nível esperado,  considerando a idade cronológica, a 
inteligência medida e a escolaridade apropriada à idade do indivíduo.”  
De acordo com o CID-10 (1999), os  distúrbios de aprendizagem são 
definidos com “Transtornos Específicos do Desenvolvimento das Habilidades 
Escolares”, sendo que correspondem a  “Transtornos nos quais as modalidades 
habituais de aprendizado estão alteradas desde as primeiras etapas do 
desenvolvimento. O comprometimento não é somente a conseqüência da falta de 
oportunidade de aprendizagem ou de um retardo mental, e ele não é devido a um 
traumatismo ou doença cerebrais.”  Aponta os seguintes problemas nesta 
categoria: Transtorno Específico de Leitura (Dislexia); Transtorno Específico de 
Soletração; Transtorno Específico da Habilidade em Aritmética; Transtorno Misto 
de Habilidades Escolares; Outros Transtornos do Desenvolvimento das 
Habilidades Escolares e o Transtorno não Especificado do Desenvolvimento das 
Habilidades Escolares. 
 Consultando o site www.schwablearning.org mantido por Charles and Helen 
Schwab Foundation (http://www.schwablearning.org/articles.asp?r=25&g=1), 
organização voltada para a orientação  e ajuda de pessoas que apresentam 
distúrbios de aprendizagem, encontramos os seguintes dados que, no geral, vão 
de encontro às definições anteriores:  

O que é um Distúrbio de Aprendizagem? (Learning Disability)  
O Distúrbio de Aprendizagem afeta o modo pelo qual crianças com inteligência 
média, ou acima da média, recebem, processam ou expressam informações e que 
se mantém por toda a vida. Isto prejudica a habilidade para aprender habilidades 
básicas em leitura, escrita ou matemática. A Coordinated Campaign for Learning 
Disabilities (CCLD), uma coalizão de organizações nacionais ligadas aos distúrbios 
de aprendizagem, define-os como “uma desordem neurobiológica na qual o 
cérebro da pessoa trabalha ou é estruturado de uma maneira diferente.” 

O que o Distúrbio de Aprendizagem não é


•  Déficit de atenção, tal como o Transtorno do Déficit de 
Atenção/Hiperatividade (TDAH). Distúrbios de aprendizagem e TDAH 
freqüentemente ocorrem ao mesmo tempo, mas não são a mesma coisa.  
•  Distúrbio de aprendizagem não é a mesma coisa que deficiência ou retardo 
mental, autismo, deficiência auditiva ou visual, deficiência física, distúrbio 
emocional ou o processo normal de aquisição de uma segunda língua.  
•  Distúrbios de aprendizagem não são causados por falta de oportunidade 
educacional como trocas freqüentes de escolas, por faltas constantes às 
aulas ou falhas no ensino das habilidades básicas. 
Quais as manifestações? 
Muitas vezes os transtornos de aprendizagem estão acompanhados de falta de 
motivação, imaturidade e problemas comportamentais. Porém, caso a criança 
apresente dificuldades significativas e mais duráveis em termos das habilidades 
básicas de leitura, escrita e aritmética, o problema deve ser um distúrbio de 
aprendizagem.  
Algumas características:  
Fase pré-escolar 
•  Começa a falar mais tarde do que a maioria das crianças 
•  Tem dificuldades para encontrar as palavras apropriadas em situação de 
conversação 
•  Tem dificuldades para nomear rapidamente palavras de uma determinada 
categoria 
•  Apresenta dificuldades com rimas 
•  Tem problemas para aprender o alfabeto, dias da semana, cores, forma e 
números 
•  É extremamente agitada e facilmente se distrai 
•  Dificuldades para seguir ordens e rotinas
Fase escolar inicial 
•  Demora para aprender as relações entre letras e sons  
•  Dificuldades para sintetizar os sons e formar palavras

•  Faz erros consistentes de leitura e de ortografia  
•  Dificuldades para relembrar seqüências e para dizer as horas  
•  Lentidão para aprender novas habilidades  
•  Dificuldades em termos de planejamento   
Fase escolar – séries mais avançadas
•  Lentidão para aprender prefixos, sufixos, rota lexical e outras estratégias de 
leitura 
•  Evita leitura em voz alta   
•  Dificuldades com os enunciados de problemas em matemática  
•  Soletra a mesma palavra de modos diferentes  
•  Evita tarefas envolvendo leitura e escrita  
•  Dificuldades para lembrar ou compreender o que foi lido  
•  Trabalha lentamente 
•  Dificuldades para compreender  e/ou generalizar conceitos  
•  Confusões em termos de endereços e informações 




DISCALCULIA


A matemática para algumas crianças ainda é um bicho de sete cabeças. Muitos não compreendem os problemas que a professora passa no quadro e ficam muito tempo tentando entender se é para somar, diminuir ou multiplicar; não sabem nem o que o problema está pedindo. Alguns, em particular, não entendem os sinais, muito menos as expressões. Contas? Só nos dedos e olhe lá.
Em muitos casos o problema não está na criança, mas no professor que elabora problemas com enunciados inadequados para a idade cognitiva da criança.
Carraher afirma que:

“Vários estudos sobre o desenvolvimento da criança mostram que termos quantitativos como “mais”, “menos”, maior”, “menor” etc. são adquiridos gradativamente e, de início, são utilizados apenas no sentido absoluto de “o que tem mais”, “o que é maior” e não no sentido relativo de “ ter mais que” ou “ser maior que”. A compreensão dessas expressões como indicando uma relação ou uma comparação entre duas coisas parece depender da aquisição da capacidade de usar da lógica que é adquirida no estágio das operações concretas”...”O problema passa então a ser algo sem sentido e a solução, ao invés de ser procurada através do uso da lógica, torna-se uma questão de adivinhação” (2002, p. 72).


No entanto, em outros casos a dificuldade pode ser realmente da criança e trata-se de um distúrbio e não de preguiça como pensam muitos pais e professores desinformados.
Em geral, a dificuldade em aprender matemática pode ter várias causas.
De acordo com Johnson e Myklebust, terapeutas de crianças com desordens e fracassos em aritmética, existem alguns distúrbios que poderiam interferir nesta aprendizagem:

  • Distúrbios de memória auditiva:
- A criança não consegue ouvir os enunciados que lhes são passados oralmente, sendo assim, não conseguem guardar os fatos, isto lhe incapacitaria para resolver os problemas matemáticos.
- Problemas de reorganização auditiva: a criança reconhece o número quando ouve, mas tem dificuldade de lembrar do número com rapidez.

  • Distúrbios de leitura:
- Os dislexos e outras crianças com distúrbios de leitura apresentam dificuldade em ler o enunciado do problema, mas podem fazer cálculos quando o problema é lido em voz alta. É bom lembrar que os dislexos podem ser excelentes matemáticos, tendo habilidade de visualização em três dimensões, que as ajudam a assimilar conceitos, podendo resolver cálculos mentalmente mesmo sem decompor o cálculo. Podem apresentar dificuldade na leitura do problema, mas não na interpretação.
- Distúrbios de percepção visual: a criança pode trocar 6 por 9, ou 3 por 8 ou 2 por 5 por exemplo. Por não conseguirem se lembrar da aparência elas têm dificuldade em realizar cálculos.

  • Distúrbios de escrita:
- Crianças com disgrafia têm dificuldade de escrever letras e números.

Estes problemas dificultam a aprendizagem da matemática, mas a discalculia impede a criança de compreender os processos matemáticos.
A discalculia é um dos transtornos de aprendizagem que causa a dificuldade na matemática. Este transtorno não é causado por deficiência mental, nem por déficits visuais ou auditivos, nem por má escolarização, por isso é importante não confundir a discalculia com os fatores citados acima.
O portador de discalculia comete erros diversos na solução de problemas verbais, nas habilidades de contagem, nas habilidades computacionais, na compreensão dos números.
Kocs (apud García, 1998) classificou a discalculia em seis subtipos, podendo ocorrer em combinações diferentes e com outros transtornos:
  1. Discalculia Verbal - dificuldade para nomear as quantidades matemáticas, os números, os termos, os símbolos e as relações.
  2. Discalculia Practognóstica - dificuldade para enumerar, comparar e manipular objetos reais ou em imagens matematicamente.
  3. Discalculia Léxica - Dificuldades na leitura de símbolos matemáticos.
  4. Discalculia Gráfica - Dificuldades na escrita de símbolos matemáticos.
  5. Discalculia Ideognóstica – Dificuldades em fazer operações mentais e na compreensão de conceitos matemáticos.
  6. Discalculia Operacional - Dificuldades na execução de operações e cálculos numéricos.

Na área da neuropsicologia as áreas afetadas são:

  • Áreas terciárias do hemisfério esquerdo que dificulta a leitura e compreensão dos problemas verbais, compreensão de conceitos matemáticos;
  • Lobos frontais dificultando a realização de cálculos mentais rápidos, habilidade de solução de problemas e conceitualização abstrata.
  • Áreas secundárias occípito-parietais esquerdos dificultando a discriminação visual de símbolos matemáticos escritos.
  • Lobo temporal esquerdo dificultando memória de séries, realizações matemáticas básicas.

De acordo com Johnson e Myklebust a criança com discalculia é incapaz de:

  • Visualizar conjuntos de objetos dentro de um conjunto maior;
  • Conservar a quantidade: não compreendem que 1 quilo é igual a quatro pacotes de 250 gramas.
  • Seqüenciar números: o que vem antes do 11 e depois do 15 – antecessor e sucessor.
  • Classificar números.
  • Compreender os sinais +, - , ÷, ×.
  • Montar operações.
  • Entender os princípios de medida.
  • Lembrar as seqüências dos passos para realizar as operações matemáticas.
  • Estabelecer correspondência um a um: não relaciona o número de alunos de uma sala à quantidade de carteiras.
  • Contar através dos cardinais e ordinais.

Os processos cognitivos envolvidos na discalculia são:

1. Dificuldade na memória de trabalho;
2. Dificuldade de memória em tarefas não-verbais;
3. Dificuldade na soletração de não-palavras (tarefas de escrita);
4. Não há problemas fonológicos;
5. Dificuldade na memória de trabalho que implica contagem;
6. Dificuldade nas habilidades visuo-espaciais;
7. Dificuldade nas habilidades psicomotoras e perceptivo-táteis.

De acordo com o DSM-IV, o Transtorno da Matemática caracteriza-se da seguinte forma:
  • A capacidade matemática para a realização de operações aritméticas, cálculo e raciocínio matemático, encontra-se substancialmente inferior à média esperada para a idade cronológica, capacidade intelectual e nível de escolaridade do indivíduo.
  • As dificuldades da capacidade matemática apresentadas pelo indivíduo trazem prejuízos significativos em tarefas da vida diária que exigem tal habilidade.
  • Em caso de presença de algum déficit sensorial, as dificuldades matemáticas excedem aquelas geralmente a este associadas.
  • Diversas habilidades podem estar prejudicadas nesse Transtorno, como as habilidades lingüisticas (compreensão e nomeação de termos, operações ou conceitos matemáticos, e transposição de problemas escritos em símbolos matemáticos), perceptuais (reconhecimento de símbolos numéricos ou aritméticos, ou agrupamento de objetos em conjuntos), de atenção (copiar números ou cifras, observar sinais de operação), e matemáticas (dar seqüência a etapas matemáticas, contar objetos e aprender tabuadas de multiplicação).

Quais os comprometimentos?

  • Organização espacial;
  • Auto-estima;
  • Orientação temporal;
  • Memória;
  • Habilidades sociais;
  • Habilidades grafomotoras;
  • Linguagem/leitura;
  • Impulsividade;
  • Inconsistência (memorização).

Ajuda do professor:

O aluno deve ter um atendimento individualizado por parte do professor que deve evitar:

  • Ressaltar as dificuldades do aluno, diferenciando-o dos demais;
  • Mostrar impaciência com a dificuldade expressada pela criança ou interrompê-la várias vezes ou mesmo tentar adivinhar o que ela quer dizer completando sua fala;
  • Corrigir o aluno freqüentemente diante da turma, para não o expor;
  • Ignorar a criança em sua dificuldade.

Dicas para o professor:
·         Não force o aluno a fazer as lições quando estiver nervoso por não ter conseguido;
·         Explique a ele suas dificuldades e diga que está ali para ajudá-lo sempre que precisar;
·         Proponha jogos na sala;
·         Não corrija as lições com canetas vermelhas ou lápis;
·         Procure usar situações concretas, nos problemas.


Ajuda do profissional:

Um psicopedagogo pode ajudar a elevar sua auto-estima valorizando suas atividades, descobrindo qual o seu processo de aprendizagem através de instrumentos que ajudarão em seu entendimento. Os jogos irão ajudar na seriação, classificação, habilidades psicomotoras, habilidades espaciais, contagem.
Recomenda-se pelo menos três sessões semanais.
O uso do computador é bastante útil, por se tratar de um objeto de interesse da criança.
O neurologista irá confirmar, através de exames apropriados, a dificuldade específica e encaminhar para tratamento. Um neuropsicologista também é importante para detectar as áreas do cérebro afetadas. O psicopedagogo, se procurado antes, pode solicitar os exames e avaliação neurológica ou neuropsicológica.

O que ocorre com crianças que não são tratadas precocemente?

  • Comprometimento do desenvolvimento escolar de forma global
  • O aluno fica inseguro e com medo de novas situações
  • Baixa auto-estima devido a críticas e punições de pais e colegas
  • Ao crescer o adolescente / adulto com discalculia apresenta dificuldade em utilizar a matemática no seu cotidiano.


Qual a diferença? Acalculia e Discalculia.
A discalculia já foi relatada acima.
A acalculia ocorre quando o indivíduo, após sofrer lesão cerebral, como um acidente vascular cerebral ou um traumatismo crânio-encefálico, perde as habilidades matemáticas já adquiridas. A perda ocorre em níveis variados para realização de cálculos matemáticos.

Cuidado!
As crianças, devido a uma série de fatores, tendem a não gostar da matemática, achar chata, difícil. Verifique se não é uma inadaptação ao ensino da escola, ou ao professor que pode estar causando este mal estar. Se sua criança é saudável e está se desenvolvendo normalmente em outras disciplinas não se desespere, mas é importante procurar um psicopedagogo para uma avaliação.
Muitas confundem inclusive maior-menor, mais-menos, igual-diferente